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DEPOIMENTO NO STF

Bolsonaro foi ameaçado de prisão se levasse golpe adiante, diz ex-chefe da Aeronáutica

Bolsonaro foi comunicado pelo então comandante do Exército, Marco Antônio Freire, que a instituição não apoiaria o golpe

Bolsonaro ao lado de chefes das Forças Armadas (Foto: Agência Brasil)
Bolsonaro ao lado de chefes das Forças Armadas (Foto: Agência Brasil)

(O Globo) O ex-comandante da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Junior prestou depoimento nesta quarta-feira ao Supremo Tribunal Federal (STF) e confirmou diversos pontos da investigação sobre uma suposta tentativa de golpe de Estado.

Baptista Junior relembrou reuniões com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), na qual foram discutidas medidas para reverter a derrota nas eleições, e relatou que o ex-comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes chegou a ameaçar Bolsonaro de prisão caso isso fosse para a frente.

O brigadeiro também afirmou que avisou a Bolsonaro que não havia provas de fraudes nas urnas eletrônicas e que o ex-presidente pressionou pelo adiamento da publicação de um relatório do Ministério da Defesa sobre o tema. O ex-chefe da Aeronáutica disse que afirmou ao então mandatário que não havia hipótese de ele continuar no cargo:

— Eu falei com o presidente Bolsonaro: aconteça o que acontecer, no dia 1º de janeiro o senhor não será presidente.

Outro ponto confirmado por Baptista Junior foi que o então comandante da Marinha, Almir Garnier Santos, teria colocado as suas tropas à disposição do presidente.

Confira os principais pontos do depoimento:

Minuta golpista

Segundo o brigadeiro, os três comandantes foram chamados seguidas vezes ao Palácio da Alvorada após a derrota de Bolsonaro nas eleições. Segundo ele, era discutida a possibilidade de um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) ou da decretação de um estado de defesa ou de sítio.

A partir de certo momento, contudo, Baptista Junior disse que começou a ficar “muito preocupado” por considerar que o objetivo dessas medidas era, na verdade, impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

— A partir de um momento, eu comecei a achar que o objetivo de qualquer medida dessa, de exceção, era, sim, para não haver a assunção pelo presidente que foi eleito — disse. — E a partir desse momento, e eu digo que isso aconteceu do dia 11 ao dia 14 [de novembro], eu fiquei bastante preocupado.

O ex-chefe da Aeronáutica disse que afirmou a Bolsonaro que não havia hipótese de ele continuar no cargo:

— Eu falei com o presidente Bolsonaro: aconteça o que acontecer, no dia 1º de janeiro o senhor não será presidente.

No dia 14 de dezembro, houve uma reunião no Ministério da Defesa com os três comandantes. Baptista Junior diz que Paulo Sérgio apresentou a eles um documento, dentro de uma pasta, para ser analisado. O brigadeiro perguntou a ele se a peça previa a “não assunção no 1º de janeiro do presidente eleito”. Como o ministro ficou em silêncio, ele interpretou que sim.

— E aí eu falei: “não ito sequer receber esse documento, não ficaria aqui”. Levantei, saí da sala e fui embora. Como eu falei para o senhor, na guerra o objetivo político é quem faz ganhar ou perder a guerra, não é o militar. E eu tinha um ponto de corte. Eu tinha muito respeito pelo presidente, por todos os meus colegas, mas eu tinha um ponto de corte.

Ameaça de prisão a Bolsonaro

Na segunda-feira, também em audiência ao STF, Freire Gomes negou ter dado “voz de prisão” a Bolsonaro.

Nesta quarta, Baptista Junior foi questionado sobre o episódio e declarou que o general afirmou, “com muita tranquilidade, com muita calma”, que prenderia o então presidente se ele seguisse adiante com o plano golpista.

— O general Freire Gomes é uma pessoa polida, educada. Logicamente ele não falou essa parte com agressividade com o presidente da República, ele não faria isso. Mas é isso que ele falou. Com muita tranquilidade, com muita calma, mas colocou exatamente isso: “se o senhor tiver de fazer isso, vou acabar lhe prendendo” — disse Baptista Junior aos ministros do STF.

Concordância de Garnier

Baptista Junior alegou que Almir Garnier, então comandante da Marinha, não tinha a “mesma postura” que ele e Freire Gomes, além do ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira.

Segundo ele, em uma reunião com Bolsonaro, enquanto tentavam demover o presidente do seu plano, Garnier teria informado que suas tropas estavam à disposição.

— Em uma dessas reuniões, eu tenho uma visão muito iva do almirante Garnier. Eu lembro que o Paulo Sérgio, Freire Gomes e eu conversávamos mais, debatíamos mais, tentávamos demover mais o presidente. Em uma dessas [reuniões], chegou o ponto em que ele falou que as tropas da Marinha estariam à disposição do presidente.

Depois, ao ser questionado pelo advogado de Garnier, Demóstenes Torres, reforçou o relato e citou o número de fuzileiros da Marinha que teria sido dito pelo ex-comandante:

— Nós não estávamos lá só para discutir base jurídica. Nós estávamos discutindo um ambiente e possibilidade. E isso foi o que o Garnier falou. Eu não fiquei sabendo à toa que a Marinha tem 14 mil fuzileiros — afirmou.

Urnas eletrônicas

O ex-comandante da Aeronáutica também narrou ter informado a Bolsonaro, em diversas oportunidades, que não foram encontradas falhas nas urnas eletrônicas.

— Comentei após o segundo turno, na reunião que nós tivemos no dia 1º de novembro. Depois comentei nas várias reuniões, cinco ou seis reuniões, que os comandantes e o ministro da Defesa tivemos com ele. E comentei com mais ênfase uma reunião no dia 14, quando ele me apresentou o relatório do IVL com um possível erro de programação.

No dia de novembro, segundo ele, o presidente entregou aos três comandantes das Forças Armadas um relatório elaborado pelo Instituto Voto Legal (IVL), que embasaria uma ação que o PL apresentou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pedindo a anulação de parte dos votos.

Baptista Junior afirmou que leu o documento e disse a Bolsonaro que ele estava “mal escrito” e tinha “sofismas”:

— No dia 14 de novembro, o presidente chamou o ministro da Defesa e os três comandantes. O presidente entregou uma cópia a cada um de nós, eu li a cópia e falei com ele. Esse relatório está muito mal escrito, ele contém erros, eu uso a palavra sofismas.

O ex-comandante também contou ter ouvido dizer que Bolsonaro atuou para adiar a publicação do relatório do Ministério da Defesa sobre fiscalização das urnas e disse acreditar que o documento poderia ter sido divulgado entre o primeiro e o segundo turno da disputa naquele ano.

— Sim, senhor. O relatório foi entregue no dia 9. Eu ouvi que sim [houve pressão para o adiamento]. Certamente outras testemunhas poderão dar isso com mais precisão.

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